sexta-feira, 6 de março de 2009

RESENHA - BRYM, Robert J (et al). Sociologia – sua bússola para um novo mundo. São Paulo: Thomson Learning, 2006, 585p.


O livro ora em questão, a despeito da densidade material, representa um esforço dos autores da UFPE em prover um sólido conteúdo teórico-técnico na preparação de novos sociólogos, visando suprir a urgente necessidade de profissionais capacitados para o ensino requerido pelo Conselho Nacional de Educação.

A partir da obra original, Sociology – your compass for a new world, o livro em português é adaptado e organizado pelos mestres da UFPE para a realidade brasileira. Robert J. Brym – Universidade de Toronto – e John Lie – Universidade da Califórnia, Berkeley –cooperados pelos sociólogos Cynthia Lins Hamlin, Remo Mutzenberg, Eliane Veras Soares e Heraldo Pessoa Souto Maior.

O livro é, segundo o próprio índice (ix – xvii), apresentado em cinco partes: Fundamentos – parte I; Processos Sociais Básicos – parte II; Desigualdade – parte III; Instituições – parte IV; e Mudança Social – parte V.

As subdivisões das partes resultam em um caráter didático da apresentação da disciplina, facilitando a pesquisa temática e interação de cada parte e, estrategicamente, levando o estudante à progressividade do aprendizado.

Voltando-nos, agora, para o capítulo proposto para resenha (pp. 2 – 24), percebe-se o testemunho da socióloga Cynthia Hamlin (História Pessoal, p. 2).

A Dra. Cynthia, em sua peregrinação em escolher uma profissão ao mesmo tempo promissora na garantia das necessidades básicas e dinâmica para mantê-la estimulada na vida profissional, interessa-se pelas Ciências Sociais, influenciada pelo herói Indiana Jones, na área de Arqueologia. A tentativa romântica de fugir da política (causada pela aversão a OSPB), a conduz à Sociologia. Aquilo que constituía-se, a princípio, como refúgio, torna-se o lar da peregrina. A disciplina que parecia difusa e incongruente, arraigada numa pressuposição popular, provoca indagações acerca da realidade dos problemas humanos e da ordem social, e que deveriam ter outras explicações além dos fatores físicos e emocionais.

Chega-se a conclusão de que a Sociologia é o “estudo sistemático do comportamento humano em seu contexto social”, dos “fatores sociais quem estão em jogo nas nossas interações com outros indivíduos e com as organizações sociais”(p. 5). Nesta perspectiva, o fiat lux para Dra. Cynthia a retira da caverna e das sombras, caindo os mitus fundantis inicial.

O relato pessoal dá lugar à apresentação da Sociologia, amparada numa análise experimental de Émile Durkheim (1858 – 1917), considerado um dos pioneiros da disciplina, acerca do suicídio. Com a análise, conclui-se que o suicídio está relacionado às diferenças no “grau de solidariedade social”(p. 5, 6). Os motivos subjetivos para o suicídio são deixados à Psicologia.

O grau de solidariedade social eleva-se numa interrelação sociedade-indivíduo onde ambos são afetados e influenciam-se mutuamente. Na compreensão dos níveis de interrelação das estruturas sociais, desde os círculos menores de relações sociais (Microestruturas – famílias, amizades, trabalho etc) até os níveis mais amplos (Estruturas Globais – relações entre países) formam-se a “consciência sociológica”.

Associado a isto, quanto mais consciente destas estruturas, mais sabedor será o estudioso em perceber a existência dos vínculos entre elas e os problemas sociais, como enfatizado por C. Wright Mills (1916 – 1962). Mas, uma pergunta deve ser feita: como se descobriu esta relação?
A história é o depositário para muitas respostas. Assim, as três grandes revoluções (Científica - ± 1550; Democrática - ± 1750; Industrial - ± 1780), são as origens da Imaginação Sociológica. O que se segue são teorias, pesquisas e valores que tentarão explicar, testar e julgar a ordem e a progressividade (Auguste Comte – 1789 – 1857, o pai do termo sociologia) do mundo como ele é e não como deveria ser(p. 12) das relações estruturais.

É claro que toda teoria possui o seu teórico. É isto que a Dra. Cynthia prosseguirá apresentando num avanço lógico de sua exposição. O Funcionalismo de Durkheim, com sua ênfase no equilíbrio social mantido ou enfraquecido pelas estruturas sociais. Talcott Paterson (1902 – 1979) e Robert Merton (1910 – 2003), ampliaram a teoria durkheimiana. A dialética hegeliana na Teoria do Conflito de Karl Marx (1818 – 1883), onde os “padrões de desigualdade na sociedade” mudam a sociedade ou dá-lhe estabilidade social” através da luta de classes(p. 16). Max Weber (1864 – 192) seria o grande questionador da visão apocalíptica marxista. Não era apenas as classes o motor da história, mas também a política e a religião (p. 17). O Interacionismo de Weber, o Simbolismo de Mead (1863 – 1931 – Universidade de Chicado) e o Dramaturgismo de Goffman (1922 – 1982), contribuem para uma análise subjetiva do desenvolvimento social. É a cosmovisão (Weltanschauung) individual ou coletiva que impulsiona a sociedade, pois a partir dela atribui-se significado às circunstâncias sociais. Assim, neste perspectiva, o fator hermenêutico é preponderante inclusive para os pontos de vistas não-oficiais, minoritários e divergentes (p. 19). O Construtivismo Social, conseqüência do Interacionismo Hermenêutico, onde a análise não é o que o mundo é, mas o que deveria ser, devido às ações recíprocas entre sujeito e sociedade. Embora a autora não use, é possível classificar o Construtivismo Social como uma hermenêutica da suspeita que procura desconstruir a realidade social como uma formação de processos e distribuição de poder envolvidos em atos de criação social. Como exemplo, a Dra. Cynthia evoca a Teoria Feminista – Harriet Martineau (1802 – 1876), primeira socióloga – que apresenta a desigualdade de gênero como fruto do poder patriarcal, responsável pela dominação masculina e subordinação feminina.

Mas a Dra. Cynthia não se detém na história exBrasil. Antes, volta o seu olhar para uma história da Sociologia no Brasil. Para isto, a Faculdade de Direito do Recife e de São Paul têm grande contribuição. Nomes como Gilberto Freyre, Fernando de Azevedo e Delgado Carvalho são os responsáveis pelo ensino da disciplina a partir de 1920. O weberianismo chega com Sérgio Buarque de Holana e com Raimundo Faoro. O marxismo com Caio Prado Junior, nos anos 40. Não faltam nomes como o do socialista Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso e sua esposa Ruth Cardoso. O Brasil começara a inserir-se no cenário mundial no campo das Ciências Sociológicas. Temas pertinentes à segmentação racial, social, econômica e até mesmo acerca do gênero, com Nísia Floresta (1810 – 1885), faziam partes dos estudos sociais nos anos 60 e 70, principalmente na USP.

Sem dúvida que as breves considerações da Dra. Cynthia Hamlim nas páginas consultadas constituem-se em bússola que apontam o norte dos que desejam enfrentar o “desafio sociológico”.


Gaspar de Souza

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